Atropelador em mercado de Natal na Alemanha era ativista anti-islã
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
QUEDLIMBURGO, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – “Sou o crítico mais agressivo do Islã na história. Se você não acredita em mim, pergunte aos árabes.”
Taleb Al A., 50, o médico preso pela polícia após atropelar dezenas de pessoas, matando ao menos quatro delas, em um mercado de Natal em Magdeburgo, na Alemanha, nesta sexta-feira (20), era um conhecido ativista anti-islã, com 40 mil seguidores no X, e simpatizante da extrema direita do país. O ataque é investigado como terrorismo.
O perfil do suspeito, cujo sobrenome não é divulgado pelas autoridades e pela imprensa alemã por questões legais e de privacidade, intriga as autoridades, já que ele não se encaixa naquele do típico terrorista. A frase que abre este texto é de uma entrevista dada por Taleb ao jornal econômico Frankfurter Allgemeine Zeitung em 2019 e republicada neste sábado (21).
O médico, à época, falava como ativista, denunciando a opressão do regime saudita aos seus cidadãos, notadamente às mulheres. Afirmava também que a perseguição a quem não se mantivesse conectado aos preceitos do islã era intensa, inclusive no exterior.
“Até há alguns anos, quase ninguém da população civil saudita sabia que existia um caminho para a liberdade: o asilo. Fui o primeiro a fornecer informações aos requerentes de asilo sauditas, primeiro no Twitter, depois no Telegram”, afirma Taleb no texto.
Ainda na reportagem, ele explica as razões de ter pedido asilo na Alemanha em 2016, dez anos depois de ter chegado ao país, mesmo já tendo vistos de residência e trabalho. Segundo ele, a pressão que sofria de seu grupo social tinha se tornado insuportável. “Eu não podia dizer a eles que não iria mais à mesquita. Os muçulmanos aqui tratam pessoas como eu, que têm origem islâmica mas não são mais crentes, sem compreensão nem tolerância.”
Entender como Taleb passou do ativismo anti-islã ao ponto de supostamente cometer um ataque normalmente imputado ao objeto de suas críticas é o desafio das autoridades neste momento. Sua atuação anti-islã era conhecida, a ponto de ele ter sido procurado para a entrevista pelo Frankfurter e merecido um alerta da Arábia Saudita para a Alemanha sobre seu comportamento -na verdade, dizendo que ele era um risco aos muçulmanos no país.
As últimas postagens do médico são ainda mais incongruentes com o desfecho do ataque. Ele reclamava que a “Alemanha que está se islamizando” e tecia elogios a Alice Weidel, candidata a premiê pela AfD (Alternativa para a Alemanha), o partido de extrema direita conhecido pela retórica agressiva anti-imigração.
Até o bilionário Elon Musk ganhava afagos. O cabo eleitoral de Donald Trump tem opinado no X sobre as eleições alemãs, com direito a elogios à AfD e provocações ao primeiro-ministro, Olaf Scholz.
A trajetória incomum de Taleb nas redes sociais sugere problemas de saúde mental, disseram alguns analistas ouvidos pela imprensa alemã. As autoridades já são criticadas por não terem detectado o comportamento peculiar do médico, cujo perfil no X tinha como imagem de destaque o desenho de um fuzil estilo AR-15.
Scholz e outros políticos alemães, incluindo integrantes da oposição, como Friedrich Merz, participam de missa em homenagem às vítimas em Magdeburgo neste sábado. Pela manhã, vistoriaram o local do ataque, no centro da cidade.
Os cinco mortos no incidente incluem um bebê. Há mais de 200 feridos, 40 deles em estado grave, e a expectativa é de que o número possa aumentar. A cidade está tomada por forças de segurança.
Alguns mercados de Natal, uma tradição na Alemanha desde a Idade Média, foram cancelados neste fim de semana pelo país. Outros tiveram a segurança reforçada e anunciam homenagens aos afetados pelo ataque na capital do estado da Saxônia-Anhalt.
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