Um em cada quatro presos no Brasil não foi julgado
Homens, jovens, negros, de baixa escolaridade e das camadas socioeconômicas mais vulneráveis. Esse é o perfil da maioria das pessoas privadas de liberdade no Brasil.
Crimes contra o patrimônio, como furtos e roubos, cerca de 40% dos casos, e relacionados ao tráfico de drogas, quase 30%, são as principais causas que levam ao cumprimento de pena no país.
As mulheres representam apenas 5% do total de presos e respondem principalmente por tráfico de drogas.
O relatório do Observatório Nacional de Direitos Humanos sobre o sistema prisional mostra também o alto índice de presos provisórios no país: um em cada quatro não foi julgado.
Carolina Diniz, coordenadora de enfrentamento à violência institucional da Organização Não Governamental Conectas, explica que muitas prisões carecem de investigação. Além do baixo investimento no trabalho das polícias civil e científica, a especialista avalia que o sistema prisional não recebe verbas suficientes para as diversas demandas.
A gente tem muito poucas pessoas presas a partir de investigações criminais de fato e um sucateamento inclusive dessa atividade policial. Então o investimento público tem sido drenado para essas ações repressivas ostensivas de segurança pública e cada vez mais reduzido na parte de investimentos para o sistema prisional em termos de condições de estrutura, educação, saúde, empregabilidade e principalmente também política de amparo à população egressa.
O orçamento da segurança pública foi alvo de um estudo publicado no fim do ano passado pela Plataforma Justa, um centro de pesquisa da sociedade civil que trabalha com dados oficiais sobre a gestão e os financiamentos públicos.
Segundo o levantamento, que considerou informações de 22 unidades da federação, referentes a 2023, de um total de R$ 98 bilhões dos orçamentos estaduais, cerca de R$ 79 bilhões foram gastos com as polícias; em torno de R$ 20 bilhões com o sistema prisional e apenas R$ 16 milhões com políticas destinadas a egressos do sistema penitenciário.
Para Sofia Fromer, coordenadora de comunicação da Plataforma Justa, a mudança do atual cenário de violação de direitos fundamentais nos presídios brasileiros passaria pela inversão desse funil de investimentos.
A gente tem um investimento muito grande, a gente gasta muito, com essa porta de entrada do sistema prisional, com as polícias – em especial – com o policiamento ostensivo feito pela polícia militar. Sobretudo a gente gasta um valor menor com o sistema prisional em si. Mas o que chama atenção é que a porta de saída, que é a política pra egresso, a gente gasta infinitamente menos. Então a gente propõe essa inversão desse funil de investimentos.
O acesso à justiça é outro dado importante do Observatório Nacional dos Direitos Humanos, que também merece análise sob o aspecto dos investimentos, nesse caso, em pessoal.
A Defensoria Pública é a principal responsável pela prestação de assistência jurídica gratuita e está presente em mais de 70% dos estabelecimentos penitenciários.
O defensor público-geral federal, Leonardo Magalhães, admite que o quantitativo de defensores é insuficiente para a demanda, mas destaca que as pessoas que não têm condições de contratar um advogado não ficam sem atendimento.
Nós estamos falando de pessoas que são condenadas, que estão cumprindo pena, mas que têm também direito ao devido processo durante a execução penal. E aí o objetivo é exatamente fortalecer a Defensoria Pública e também contribui para redução da população carcerária no país. Porque muitas pessoas poderiam estar submetida ao regime de progressão de pena ou cumprimento de pena menos gravosos do atual ou até mesmo a liberdade condicional e eventualmente estão presas ali exatamente pela demanda que se tem.
Apesar do grande volume de trabalho e das desigualdades regionais marcantes, mutirões carcerários das defensorias públicas buscam a revisão de processos penais.
Nos últimos dez anos, mais de dois milhões de audiências de custódia foram realizadas no país. O instrumento é fundamental para garantir a legalidade das prisões e prevenção de abusos. Segundo o CNJ, nesse período, 41% das pessoas apresentadas em audiências de custódia tiveram a liberdade concedida.